Cortes na Mão
As mãos são nossa principal ferramenta de interação com o mundo, o que as torna extremamente vulneráveis a acidentes. Um corte na mão pode variar de um arranhão superficial na pele a uma lesão complexa que compromete estruturas vitais.
Este guia ajuda você a entender a gravidade do seu ferimento e direciona para os tratamentos específicos de cada estrutura que pode ter sido lesionada.

O Que É?
Um corte na mão (ferimento corto-contuso) é a ruptura da pele causada por objetos afiados, serras ou esmagamentos.
A grande questão é que a mão possui uma anatomia “compacta”. Em um espaço muito reduzido, correm estruturas nobres (tendões, nervos e artérias) vitais para o funcionamento do membro.
A gravidade da lesão varia imensamente, mas a situação mais crítica ocorre quando há lesão vascular. Se as artérias digitais forem cortadas, o fluxo de sangue para a ponta do dedo é interrompido, causando isquemia (falta de circulação). Isso é uma emergência absoluta, pois se o sangue não voltar a circular rapidamente, o dedo pode sofrer necrose e ser perdido. Além disso, cortes podem resultar em lesões de tendões, nervos ou lesões de ponta de dedo complexas.
Causas e Fatores de Risco
A maioria dos cortes ocorre em acidentes domésticos (cozinha, bricolagem) ou no ambiente de trabalho.
Objetos Cortantes: Facas, louça quebrada (vidro/cerâmica) e latas.
Ferramentas: Serras circulares, makitas, estiletes e prensas.
Animais: É crucial ter atenção redobrada se o ferimento for causado por dentes. As infecções por mordidas (de gatos, cães ou humanas) inoculam bactérias profundas e exigem antibióticos e limpeza cirúrgica imediata, diferente de um corte limpo de faca.
Sintomas Mais Comuns
Além da dor e do sangramento, os sintomas revelam exatamente quais estruturas foram atingidas. A ordem de gravidade começa pela circulação:
Dedo Branco, Frio ou Roxo (Falta de Circulação): Este é o sintoma mais grave. Se o dedo ficar pálido, gelado ou sem enchimento capilar (não fica rosado quando apertado), indica que as artérias digitais foram cortadas. Isso causa isquemia e requer cirurgia de urgência para salvar o dedo da necrose.
Perda de Movimento (Dobrar): Se o corte foi na palma da mão ou na parte interna dos dedos e você não consegue fechar a mão, provavelmente houve uma lesão dos tendões flexores.
Perda de Movimento (Esticar): Se o ferimento foi no dorso (costas) da mão e o dedo ficou “caído”, indica uma ruptura dos cabos extensores, conhecida como lesão dos tendões extensores.
Ponta caída (Dedo em Martelo): Um caso específico é quando o corte ocorre bem no dorso da articulação final do dedo. Isso corta o tendão terminal e faz a ponta ficar caída, caracterizando um dedo em martelo por ferimento cortante.
Dormência e Choque: Se você sente o dedo dormente (anestesiado) ou com formigamento após o corte, um nervo sensitivo foi atingido. O diagnóstico indica a necessidade de reconstrução de nervos periféricos com microcirurgia para recuperar o tato.
Amputação: Em casos dramáticos onde uma parte do dedo é totalmente separada do corpo, o reimplante de dedo deve ser avaliado imediatamente como uma tentativa de salvar o membro.
Diagnóstico
O diagnóstico vai muito além de olhar o tamanho do corte. O médico realiza um exame minucioso para testar a integridade de todas as estruturas nobres, seguindo uma ordem de prioridade:
Avaliação da Perfusão (Circulação): É o primeiro passo. O médico verifica a temperatura e a cor do dedo em comparação aos outros. Realiza-se o teste de enchimento capilar (apertar a ponta do dedo e soltar) para garantir que o sangue está chegando. Se o dedo permanecer pálido ou demorar para ficar rosado, confirma-se a suspeita de lesão vascular.
Avaliação Nervosa: O teste de sensibilidade (toque leve com a ponta de uma caneta ou clipe) é crucial. Se houver falha, indica a necessidade de reconstrução de nervos periféricos.
Teste Motor (Tendões): O médico pedirá para você mover cada dedo isoladamente (dobrar e esticar) para testar a integridade dos tendões.
Raio-X: É obrigatório para ver se há fraturas associadas ao corte ou pedaços de vidro/metal escondidos.
Exploração: Muitas vezes, só é possível saber a extensão total do dano olhando dentro da ferida sob anestesia no centro cirúrgico.
Tratamento
O que você faz nos primeiros minutos é crucial:
Lave a ferida com água corrente e sabão neutro.
Comprima o local com um pano limpo por 10 minutos para parar o sangramento.
Amputações: Se houve a perda total de uma parte do dedo, proteja a peça em um saco plástico limpo e coloque esse saco em água com gelo (nunca direto no gelo). Corra para o hospital, pois um reimplante de dedo pode ser possível se o atendimento for rápido.
Vá ao Pronto-Socorro para limpeza e avaliação do especialista.
Cirurgia
Se houver lesão de estruturas profundas, a sutura da pele no pronto-socorro não resolve o problema. É necessária uma cirurgia específica com o Cirurgião de Mão.
Exploração e Reparo: No centro cirúrgico, ampliamos o corte para identificar todas as estruturas. Realizamos a costura dos tendões (tenorrafia) e a microcirurgia de nervos e vasos sanguíneos (reparo vascular), utilizando microscópio para restabelecer a função e a circulação.
Prazo: O tempo é definido pela gravidade.
Lesões Vasculares (Isquemia): Se o dedo estiver sem circulação (branco ou roxo), a cirurgia deve ser imediata (emergência) para evitar a necrose e perda do dedo.
Tendões e Nervos: O ideal é operar nos primeiros dias após o acidente, antes que os tendões ou nervos encolham ou cicatrizem na posição errada, o que dificulta muito o reparo.
Prognóstico e Recuperação
A recuperação depende da gravidade. Cortes simples de pele cicatrizam em 14 dias. Já as lesões de tendão exigem imobilização por 4 a 6 semanas e muita terapia da mão.
Complicações Tardias: Uma queixa comum em cortes antigos é a dor tipo “choque” ao encostar na cicatriz. Isso acontece quando o nervo cicatriza de forma desorganizada, formando um neuroma traumático. Se for o seu caso, saiba que também existe tratamento cirúrgico específico para o alívio dessa dor.
Quando Procurar o Especialista
Vá para um Pronto-Socorro ou procure um Cirurgião de Mão IMEDIATAMENTE se:
Sinal de Isquemia (Urgência Máxima): O dedo está pálido (branco), muito frio ou arroxeado. Isso indica que as artérias foram cortadas e o sangue não está chegando. A cirurgia precisa ser feita em horas para evitar a necrose e perda do dedo.
Sangramento incontrolável: O sangue sai em jatos ou não para mesmo após 10 minutos de compressão.
Perda de Função: Você não consegue dobrar ou esticar a ponta do dedo (lesão de tendão) ou não sente o toque (lesão de nervo).
Amputação: Houve perda total ou parcial de um segmento do dedo.
Dúvidas Frequentes (FAQ)
Posso colar o corte com “superbonder” em casa? Não. Colas comuns são tóxicas. Além disso, fechar a pele em casa pode mascarar lesões graves lá embaixo (como um tendão cortado parcialmente que vai romper depois) e aprisionar bactérias, causando infecções graves, especialmente em mordidas ou cortes sujos.
Cortei o dedo e ele está dormente. A sensibilidade volta sozinha? Se o nervo foi cortado, não. A dormência indica interrupção do “fio” que leva a sensação. É necessária uma microcirurgia para costurar o nervo (neurorrafia). Mesmo com cirurgia, a sensibilidade demora meses para retornar (o nervo cresce 1mm por dia).
O dedo está branco e frio. Posso esperar até amanhã? Jamais. Isso é sinal de isquemia (falta de sangue). Se as artérias digitais foram cortadas, o dedo está morrendo por falta de oxigênio. A cirurgia de revascularização deve ser imediata para tentar salvar o membro.
Acho que ficou um pedaço de vidro dentro. É perigoso? Sim. O corpo tenta expulsar o corpo estranho, gerando inflamação crônica e infecção. Além disso, o vidro pode se mover lá dentro e cortar um tendão ou nervo dias depois. O Raio-X é obrigatório em acidentes com vidro ou cerâmica.
Se você se identifica com esses sintomas, uma avaliação especializada é fundamental. Agende sua consulta para um diagnóstico preciso e para iniciarmos o tratamento adequado.
